Economia - Como sempre, "it's the economy, stupid" e a economia continua a ser o factor mais importante que os eleitores analisam quando decidem o seu voto. Actualmente, a economia norte-americana está numa situação relativamente positiva, com o desemprego em baixa, a bolsa em alta e o poder de compra a subir ligeiramente. Segundo as tendências, a economia ainda melhorará, ainda que pouco significativamente, até 5 de Novembro.
Posto isto, seria de esperar que Kamala Harris, vice-presidente na actual administração, colheria os louros da boa prestação económica dos Estados Unidos. Contudo, no tema da economia, é Donald Trump que tem levado vantagem junto dos eleitores, principalmente pelo trauma que a alta inflação de 2022 e 2023 deixou na população norte-americana durante o mandato de Biden e porque a maioria dos eleitores tem memória positiva do mandato de Trump no que à economia diz respeito.
Democracia - A insurreição de 6 de Janeiro de 2021 e a negação da derrota na última eleição por parte de Trump, colocou dúvidas sobre a saúde da democracia dos Estados Unidos da América. Muitos democratas temem que, caso perca, Donald Trump volte a não assumir a derrota e apele à revolta dos seus apoiantes, o que pode originar numa nova onda de violência. Temem ainda que, caso vença, Trump utilize o seu poder presidencial para atacar até acusar judicialmente os seus adversários políticos.
Por seu lado, grande parte do eleitorado republicano, baseado em informação falsa e totalmente infundada, preocupa-se com uma eventual fraude eleitoral, como votos de imigrantes ilegais, que impeçam a vitória do seu candidato, como alegam, falsamente, ter acontecido há quatro anos.
Segurança e Imigração - Apesar de serem dois temas claramente distintos, escolhi juntar a segurança e imigração num só tópico dada a clara estratégia da campanha republicana em ligar a imigração a uma alegada sensação de insegurança no país. Para a história dos debates presidenciais americanos ficou já a estapafúrdia frase de Trump "They're eating cats and dogs", alegando que imigrantes do Haiti estariam a raptar e comer animais domésticos numa pequena cidade do Ohio. Apesar dos exageros e da retórica incendiária de Trump, a verdade é que os americanos estão mesmo preocupados com o aumento dos números da imigração e com a situação na fronteira com o México, que continua a ser atravessada por milhares de imigrantes ilegais à procura de uma vida melhor.
Apesar de os Estados Unidos serem, desde a sua fundação, a Terra da Oportunidade e de a Estátua da Liberdade ter uma inscrição que começa com "Give me your tired, your poor", a desconfiança em relação aos que chegam do exterior tem vindo a crescer. E já não são apenas os brancos a defender uma maior restrição à imigração: os afro-americanos e mesmo os hispânicos de segunda ou terceira geração temem uma grande vaga migratória que ameace os seus empregos e mesmo a sua segurança. Por isso, este é um tema onde a mensagem republicana, de fecho de fronteiras e deportação de imigrantes ilegais leva vantagem sobre a posição mais permissiva dos democratas.
Educação e Saúde - Menos presenet do que noutros ciclos eleitorais, os assuntos internos da nação americana, como a educação, a saúde ou a segurança social, têm sido, desta vez, menos falados. Isto acontece, principalmente, porque é menor a diferença entre as posições dos dois grandes partidos. Trump é um populista e não um conservador fiscal e defensor de um small government, como os candidatos republicanos tradicionais, e até já deixou de tentar desmantelar o Obamacare, o sistema de saúde reformado por Barack Obama que, ao longo dos anos, se tornou bastante popular. Como é tradicional, os norte-americanos continuam a confiar mais nos democratas para estes temas, mais relacionados com o welfare state e com os serviços providenciados pelo estado, por isso talvez não seja uma boa notícia para eles que estes assuntos estejam menos presentes na campanha.
Aborto - Se no tópico anterior falei num assunto caro aos democratas, mas agora menos premente na opinião pública, o aborto pode muito bem ter sido o tema que veio compensar essa perda. A revogação da "Roe v Wade" pelo Supremo Tribunal voltou a trazer o aborto para a linha da frente das campanhas eleitorais norte-americanas. Este tema tem sido bastante "cavalgado" pelos candidatos democratas e essa estratégia teve resultados muito positivos nas eleições intercalares de 2022. Sem uma resposta coerente e eficaz para um assunto onde a posição republicana é altamente impopular, o GOP tem procurado não falar no tema, o que não tem resultado perante a insistência democrata em apostar no aborto como tópico constante no trilho de campanha. Donald Trump tem feito grandes flip flops sobre este tema, o que ainda tem ajudado mais a campanha de Kamala Harris, que aposta forte neste tópico para incentivar o eleitorado feminino (em especial, as jovens) a votar na candidata democrata.
Política Externa - Deixei para o fim o tema que nos diz mais a nós, não norte-americanos: a política externa dos Estados Unidos. Este ano, a guerra na Ucrânia e o conflito israelo-palestiniano têm dominado as notícias e trazem algumas da mais profundas diferenças entre Kamala Harris e Donald Trump. Se Kamala quer manter e até aumentar o apoio norte-americano à Ucrânia, já Donald Trump, cuja boas relações com Putin são conhecidas, já disse querer cortar o apoio à nação invadida pela Rússia e ajudar a encontrar uma solução imediata para o fim da guerra na Europa Oriental. No que diz respeito à situação no Médio Oriente, o candidato republicano é totalmente pró-israelita enquanto que a democrata tenta um maior equilíbrio entre o apoio a Israel e a procura de uma solução de dois estados para o conflito, apelando à contenção de Israel nas suas acções militares, reflectindo esta posição uma maior divisão do eleitorado democrata à relativamente questão israelo-palestiniana.
Assim, se Putin e Netanyahu preferirão, obviamente, uma vitória de Donald Trump, já a esmagadora maioria do mundo ocidental torcerá pela vitória de Kamala Harris, até porque o anterior presidente continua a ameaçar com um isolacionismo cada vez mais pronunciado e que poderá minar a coligação política e militar do Ocidente. Porém, para os norte-americanos, em 2024, a política externa continuará a ser muito pouco relevante na hora de escolherem em quem votar, já que serão os assuntos internos, referidos em cima, a revestirem-se de maior importância para a grande decisão de 5 de Novembro.
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