quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

State of the Union 2015

Barack Obama realizou ontem o habitual discurso do Estado da Nação perante o Congresso dos Estados Unidos. Foi a primeira vez que o Presidente norte-americano discursou no órgão legislativo federal desde que os republicanos assumiram a maioria do Senado e terá sido o seu último State of the Union (SOTU) relevante para o que resta da sua Presidência (daqui a um ano já estarão a decorrer as primárias presidenciais e o SOTU perderá importância).
Foi um Presidente aguerrido e confiante aquele que compareceu na Câmara dos Representantes, ontem à noite. Desde a derrota democrata nas eleições intercalares, Obama parece renascido e com uma nova dinâmica. Os números das sondagens revelam isso mesmo e o actual ocupante da Sala Oval tem já índices de aprovação muito perto dos 50%, valores que, há pouco tempo, parecia que Obama nunca mais iria atingir neste seu último mandato na Casa Branca.
No seu discurso, Barack Obama apresentou uma clara defesa ao que a sua Administração alcançou nestes últimos seis anos e deixou bem claro que os seus principais feitos, como o Obamacare, a reforma de Wall Street ou a amnistia de imigrantes ilegais não serão revertidos pela oposição. Além disso, apresentou o seu plano para os seus dois últimos anos na Casa Branca, reafirmando a sua aposta na classe média, que considera o principal pilar da economia e da sociedade norte-americana, defendendo cortes fiscais para estes cidadãos, que serão possíveis com aumentos de impostos para os norte-americanos mais abastados.
Assim, assistiu-se, ontem, no Capitoll Hill, a um Presidente mais combativo do que apaziguador, ainda que Obama tenha recuperado um dos seus mais famosos discursos de sempre para afirmar que os críticos estão errados quando dizem que não cumpriu a sua ideia de uma América unida, em vez de uma América dividida em liberais e conservadores, ou em negros e brancos. 
Como é normal nestas ocasiões, a recepção ao seu discurso foi francamente positiva - uma sondagem da CNN mostrou que 81% dos norte-americanos deram uma nota positiva ao discurso do Presidente. Com este State of the Union, Barack Obama terá ganho ainda mais momentum, que lhe será, certamente, muito útil para enfrentar esta recta final da sua presidência. De facto, Obama volta a ser relevante e a ter capital político para fazer valer as suas ideias, mesmo perante um Congresso hostil e dominado pelo GOP. E isso também são boas notícias para Hillary Clinton, a provável nomeada presidencial para 2016 que logo após o final do SOTU deixou no Twitter o seu apoio a Barack.
Para o fim fica aquele que foi, no meu entender, o melhor momento de Barack Obama neste State of the Union. E, curiosamente, até foi improvisado...

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Tiro no porta-aviões

A base das Lajes, também conhecida como o porta-aviões do Atlântico, cedida por Portugal aos norte-americanos no âmbito do Acordo de Cooperação e Defesa celebrado pelos dois países tem estado, nos últimos dias, no centro do debate político no nosso país. Isto porque a decisão dos Estados Unidos, há muito anunciada, de reduzir drasticamente a presença na ilha Terceira foi agora confirmada pelo Pentágono.
Com os norte-americanos presentes na ilha desde a década de 40 do século passado, a enorme redução do efectivo militar dos Estados Unidos na Base das Lajes terá vastas repercussões na realidade sócio-económica da ilha, que depende, em grande parte, da actividade da base aérea. Por isso, a reacção por parte das autoridades locais e regionais não se fez esperar e o Presidente do Governo Regional dos Açores, Vasco Cordeiro, classificou a decisão norte-americana como "hostil" e deslocou-se ao continente para apelar ao Governo e ao Presidente da República que encetem todos os esforços para reverter a posicão de Washington. 
É compreensível que Vasco Cordeiro, como líder da Região Autónoma dos Açores, faça tudo o que estiver ao seu alcance para reverter ou minimizar o downscale norte-americano nas Lajes, dadas as consequências negativas que se prevêem para a Terceira. Contudo, também é verdade que Vasco Cordeiro tem exagerado na retórica e nos argumentos utilizados para fazer valer o seu ponto de vista, especialmente quanto sugeriu, de forma algo atabalhoada, que Portugal poderia ceder a base das Lajes aos chineses.
Portugal pode e deve defender os seus interesses junto das autoridades norte-americanas. Contudo, roça o ridículo estarmos a ameaçar ou a fazer chantagem junto da maior potência económica e mundial do planeta. Terão de ser a diplomacia e o soft power nacionais a funcionar para que a posição norte-americana seja, pelo menos, suavizada. Mas não ajuda que o actual líder diplomático português seja Rui Machete, alguém de quem os norte-americanos não têm propriamente a melhor imagem, depois do seu mandato à frente da Fundação Luso-Americana, que desagradou, de sobremaneira, aos Estados Unidos.
Além disso, se o Presidente do Governo Regional dos Açores está a defender os interesses dos açorianos, também o governo norte-americano está, com a decisão de reduzir a presença nas Lajes, a procurar zelar pelos interesses do seu país e dos seus cidadãos. Há já alguns anos que o governo dos Estados Unidos e o Pentágono têm vindo a apostar no fecho de várias bases militares, nacionais e internacionais, como forma de reduzir os custos operacionais das forças armadas norte-americanas e de responder às mudanças da realidade geoestratégica mundial.
O encerramento de várias bases militares nos Estados Unidos tem resultado numa repetição, em vários locais, daquilo que se passa actualmente na Terceira: contestação, consequências na economia local e estadual e um forte lobby contra essas medidas. Por isso, se o governo norte-americano tem prosseguido nesse caminho, apesar dos fortes protestos de eleitores e políticos do seu país, será que o protesto de eleitores e políticos portugueses o farão mudar de ideias?

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Um amigo atrasado

O Secretário de Estado norte-americano, John Kerry, está em Paris para demonstrar a solidariedade dos Estados Unidos para com os franceses, após os atentados terroristas da semana passada que assombraram a Europa e o mundo. Segundo o chefe da diplomacia norte-americana, a sua visita serve para "dar um abraço a Paris" e transmitir todo o apoio do seu país para com a França em choque.
Contudo, este é um tímido lavar de face por parte da Administração Obama, que cometeu uma gigantesca e incompreensível gaffe ao não enviar nenhum representante à grande manifestação de Paris, realizada no passado Domingo em honra das vítimas do atentado e em repúdio ao terrorismo. De facto, Barack Obama foi o grande ausente da manifestação que reuniu praticamente toda a liderança europeu e contou até com os líderes turco, israelita e palestiniano. E se é compreensível que o  Secret Service tenha vetado a presença de Obama por não ter tempo suficiente para preparar e montar todo o esquema de segurança necessário para a a presença do Chefe de Estado norte-americano num evento deste género, também é verdade que a Casa Branca poderia ter enviado o Vice-Presidente Joe Biden ou mesmo John Kerry, que até tem boas ligações com os franceses (a sua reacção em francês aos atentados caiu bem no Eliseu). No mínimo dos mínimos, Obama poderia e deveria ter sido representado por Eric Holder, o Attorney-General dos Estados Unidos, que até estava em Paris nesse fim-de-semana. O que é certo é que o país que sofreu os atentados do 11 de Setembro e lidera a luta contra o terrorismo radical islâmico não poderia ter sido representado apenas pela sua embaixadora em Paris.
Como não poderia deixar de ser, esta falha da Administração Obama mereceu diversas críticas, o que obrigou mesmo a Casa Branca a admitir o erro e enviar John Kerry a Paris para minimizar os danos. Mas o Secretário de Estado não está sozinho a tentar compensar as falhas da liderança norte-americana e conta com um apoio de peso. O conceituado guitarrista James Taylor acompanhou Kerry numa visita aos responsáveis franceses e dedicou-lhes o tema "You've got a friend". Sim, os franceses têm nos Estados Unidos um amigo. Ainda que um amigo muito, muito atrasado...

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Como a história julgará Obama

Ao entrarmos nos dois últimos anos do segundo e final mandato de Barack Obama na Casa Branca, é altura de se começar a perceber qual será o legado do 44º Presidente dos Estados Unidos. É certo que é ainda muito, muito cedo para ser clara a forma como a História julgará Obama. Contudo, é certo que o primeiro afro-americano a ocupar a Sala Oval deixará uma forte marca através da sua presidência. 
A reforma do sistema de saúde norte-americano constituirá, quase de certeza, o seu maior feito, mas a presidência de Obama tem vários outros destaques. O lançamento da recuperação económica norte-americana merece o primeiro plano, mas a legalização de milhões de imigrantes ilegais, a (tímida) reforma de Wall Street, a nomeação de duas mulheres (uma delas hispânica) para o Supremo Tribunal, a retoma das relações diplomáticas com Cuba, a eliminação de Bill Laden e a melhoria da imagem dos Estados Unidos no mundo também têm lugar na lista de principais feitos da Administração Obama.
Por outro lado, Barack Obama falhou rotundamente naquela que foi, porventura, a sua principal promessa eleitoral: 6 anos depois da sua eleição, o ambiente política em Washington está mais polarizado do que nunca e democratas e republicanos são incapazes de chegar a qualquer tipo de compromisso. Além disso, na frente externa, e apesar de Obama ter retirado as tropas norte-americanas do Iraque e do Afeganistão, o Médio Oriente continua um barril de pólvora e a emergência do Estado Islâmico pode obrigar a um regresso das forças armadas dos Estados Unidos à península arábica. E Guantánamo continua em funcionamento...
Este é apenas um pequeno resumo dos principais destaques da presidência de Obama, sendo certo que, daqui a dois anos, será ocasião de aprofundarmos este assunto. Seja como for, este texto serviu como prelúdio para apresentar um artigo da New York que nos mostra um testemunho de 53 historiadores sobre o legado de Barack Obama. Vale a pena ler.