No início da sua carreira política, Barack Obama começou a ganhar notoriedade quando, em 2002, e contra a opinião generalizada na época, se opôs publicamente à intervenção norte-americana no Iraque. Mais tarde, por ocasião da sua candidatura à Casa Branca, em 2008, essa posição foi-lhe muito útil para estabelecer uma verdadeira diferença face a Hillary Clinton, que havia votado a favor da guerra no Senado.
Agora, onze anos e um Prémio Nobel da Paz depois, o Presidente dos Estados Unidos está do lado contrário e defende a intervenção do país num conflito armado, mais precisamente na Síria. Há umas semanas atrás, Obama havia limitado a sua acção ao afirmar que a utilização de armas químicas por parte do regime de Bashar al-Assad era o limite que, se fosse ultrapassado, obrigaria os Estados Unidos a intervir militarmente no conflito.
Com o uso de gás Sarin por parte das forças leais ao regime sírio, que os norte-americanos alegam estar comprovado inequivocamente, Obama foi forçado a agir. Numa primeira instância, os Estados Unidos procuraram o tradicional apoio britânico, que lhes foi negado após a rejeição da intervenção britânica por parte da Câmara dos Comuns. Ainda assim, outros aliados, como a França de François Hollane, parecem dispostos a colocar-se do lado dos norte-americanos.
Contudo, quando tudo parecia encaminhar-se rapidamente para a intervenção dos Estados Unidos e dos seus aliados, Obama decidiu, de forma algo surpreendente, solicitar a autorização do Congresso para a utilização das forças armadas norte-americanas na Síria. Esta é uma prática prevista na Constituição, mas que caiu em desuso desde que Harry Truman entrou na Guerra da Coreia sem autorização do Congresso. Esta decisão de Obama terá sido, provavelmente, inflenciada pela opinião pública norte-americana (a esmagadora maioria defendia a consulta do Congresso) e também pelo que sucedeu no Reino Unido.
É agora incerta a decisão do Congresso dos Estados Unidos. Há dúvidas e resistências à intervenção norte-americana em ambos os partidos, mas a maior dor de cabeça para a Casa Branca são os repblicanos da Câmara dos Representantes. John Kerry e Chuck Hagel, respectivamente Secretários de Estado e da Defesa dos Estados Unidos, estão a utilizar toda a sua influência para garantir o maior número de votos e contam ainda com o apoio de republicanos proeminentes como John McCain, que já referiu que uma recusa por parte do órgão legislativo seria "catastrófico". Todavia, a ala libertária do GOP, liderada pelo Senador Rand Paul, parece decidida a colocar muitas dificuldades à autorização do uso da força pelo Presidente.
Sendo incerta a resposta do Capitólio a este pedido presidencial, vislumbram-se já algumas consequências importantes resultantes da decisão de Barack Obama em solicitar a autorização do Congresso para a intervenção militar na Síria. Em primeiro lugar, reverte-se a tendência que parecia imparável desde a II Guerra Mundial de reforço do poder presidencial. Com o precedente aberto por Obama, é provável que, no futuro, seja mais díficil para um Presidente norte-americano intervir num conflito externo sem consultar previamente o órgão legislativo.
Em segundo lugar, o debate no Congresso deixa a nú a divisão que reina actualmente no seio do Partido Republicano. Outrora o partido tough on foreign relations por excelência, com uma maior tendência para o uso do hard power, o GOP está agora a braços com um facção libertária que acredita no isolacionismo cada vez mais influente e que afasta o partido do rumo seguido nos últimos anos.
Assim sendo, se o voto da Congresso for no sentido de negar ao Presidente o uso da força, então Rand Paul e os seus correligionários libertários darão uma extraordinária demonstração de força. Contudo, colocarão em causa o poder e a influência dos Estados Unidos no mundo e, com a China e a Rússia à espreita para se assumirem como líderes planetários, isso não pode ser positivo para o mundo ocidental.
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