terça-feira, 31 de agosto de 2010

Alarme geral para os democratas

A precisamente nove semanas das eleições intercalares, os democratas já não podem esconder ou disfarçar o óbvio: perspectiva-se uma enorme derrota eleitoral em Novembro, que deverá significar a perda do controlo da Câmara dos Representantes e talvez do Senado (sendo certo que nesta câmara perderão sempre muitos lugares), além da derrota em corridas para o cargo de governador estadual em alguns dos mais importantes estados da União.
O último sinal que comprova a formação desta tempestade, que se aproxima a grande velocidade, veio da mais recente tracking poll semanal da Gallup, que concedeu a maior vantagem de sempre dos republicanos sobre os democratas no voto nacional para o congresso: nada menos que 10 pontos percentuais (51%-41%). Com tamanho choque, nem a ligeira recuperação democrata nos números da Rasmussen serve de consolo.
A grande impopularidade da liderança democrata no Congresso, com a speaker Nancy Pelosi e o líder da maioria no Senado Harry Reid à cabeça, e a manutenção dos números de aprovação do trabalho de Barack Obama bem abaixo da linha dos 50%, leva já a que, um pouco por todo o país, os candidatos democratas se distanciem da chefia do seu partido, com alguns deles a irem mais longe, criticando mesmo os seus líderes e as suas políticas. E mesmo entre os políticos democratas mais leais à liderança partidária surge com redobrada insistância a noção de que Obama precisa de começar a fazer rolar cabeças na sua administração, nomeadamente na esfera económica - o Secretário do Tesouro, Timothy Geithner, e o Conselheiro da Casa Branca para as questões económicas, Larry Summer, são os nomes mais falados.
Porém, parece-me que a melhor solução democrata não passa por uma mera mudança de caras na administração, mas sim pela melhor gestão da mensagem que transmitem ao público americano. É certo que surgiram problemas que fogem ao controlo de qualquer governo, como o desastre ambiental no Golfo do México. Mas, numa altura em que o emprego e a economia são os problemas que mais assolam o dia-a-dia dos americanos, a Casa Branca e o Congresso, controlados pelos democratas, têm falhado na tarefa de tranquilizar a população e de demonstrar que estão empenhados em melhorar a situação do país. Hoje mesmo, o presidente americano irá dirigir-se ao país e o tema é a retirada americana do Iraque. Esta é mais uma promessa cumprida de Obama e o presidente não irá deixar de lembrar isso mesmo. O problema é que este tema soa a George W. Bush, a pessimismo e a desilusão, numa altura em que os americanos precisam é de esperança e confiança.
O alarme continua a tocar e a maioria dos democratas já o ouviu. Será que Obama, Pelosi e companhia não o estão a ouvir? Ou será que o preferem ignorar?

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Uma questão de entusiasmo

Um dos principais problemas que se coloca aos democratas para as eleições intercalares de Novembro é a falta de motivação do  seu eleitorado, especialmente quando comparado com a grande onda de entusiasmo e mobilização do outro lado da barricada. 
Todas as sondagens indicam que são os eleitores republicanos que se encontram mais entusiasmados com as eleições que se aproximam e isso reflecte-se na percentagem daqueles que dizem que irão definitivamente votar no dia 2 de Novembro. Já o eleitorado democrata está menos motivado para o voto, o que se poderá traduzir numa maior taxa de abstenção entre os votantes mais liberais, especialmente quando não existe um nome altamente mobilizador no boletim de voto, como Barack Obama. 
O Partido Republicano tem sabido motivar o seu eleitorado, mas o maior mérito nesta matéria tem que ir para grupos como o Tea Party que, recorrendo a temas queridos para os sectores mais conservadores da sociedade americana, como o tamanho excessivo do governo, a defesa dos valores tradicionais, ou o segurança nacional, têm agregado um grande número de simpatizantes. Assim, é de esperar que este entusiasmo se traduza num grande número de eleitores conservadores quando foram chamados a votar, daqui a pouco mais de dois meses.
Por seu lado, os democratas estão com grandes problemas em motivar os seus apoiantes e este dado é particularmente preocupante em ano de eleições intercalares, com uma abstenção normalmente superior à de anos de eleições presidenciais, especialmente entre os eleitores afro-americanos, que votam, em larguíssima maioria, no Partido Democrata. Para contrariar este desânimo entre as suas hostes, os democratas têm de deixar a defensiva e passar a jogar ao ataque. E até têm algumas armas na mão. Contam com uma grande vantagem a nível financeiro, podem e devem aproveitar-se de algumas escolhas de candidatos por parte dos republicanos, como Sharron Angle no Nevada, ou Rand Paul no Kentucky e têm de se esforçar mais para "vender" com sucesso a obra feita na primeira metade do mandato de Obama: a reforma da saúde e do sector financeiro, o suster da crise económica, a retirada do Iraque, o novo acordo START, etc.
Não parece, então, que faltem bandeiras aos democratas para usar na campanha eleitoral. Mas, pelo menos para já, a verdade é que estão a perder a batalha da mensagem para os republicanos. E, a manter-se este panorama até as midterms, é provável que o entusiasmo republicano, conjugado com a falta de motivação democrata, resulte numa estrondosa vitória para o partido que, desde 2006, praticamente só conhece o sabor da derrota.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Continuam as primárias

Kendrick Meek venceu na Florida
Ontem à noite, nos Estados Unidos, disputou-se mais uma ronda de eleições primárias, tendo ido a votos os eleitores do Alasca, do Arizona, da Florida e do Vermont (no Oklahoma houve ainda uma segunda volta de uma primária republicana para o Congresso). E destas corridas saíram alguns resultados interessantes e relevantes para a grande decisão de 2 de Novembro, nas eleições intercalares de 2010.
No Arizona, John McCain, o candidato presidencial do GOP que, em 2008, foi derrotado por Obama, conseguiu a nomeação republicana para defender o seu próprio lugar no Senado, vencendo por larga margem J. D. Hayworth. Contudo, esta vitória - que há não muito tempo atrás chegou a parecer estar em risco - custou muitos pontos políticos a McCain, que foi obrigado a gastar uma grande soma de dinheiro e a promover uma viragem ideológica à direita para derrotar Hayworth, mais conservador e apoiado pelo Tea Party. De facto, McCain, outrora o maverick Partido Republicano, mudou de opinião em muitos temas para conseguir atrair o eleitorado mais conservador das primárias do seu partido, como, por exemplo, na questão da imigração, ou dos homossexuais nas Forças Armadas.
Mais a leste, na Florida, duas corridas merecem destaque: as primárias democratas para o Senado e as primárias republicanas para o cargo de governador estadual. No primeiro caso, o vencedor foi Kendrick Meek, o candidato apoiado pelo establishment democrata, derrotando o milionário Jeff Greene por uma margem confortável. Porém, este desfecho pode não ser o mais favorável para os destinos dos democratas na Florida. Isto porque Meek, um congressista com história no partido e próximo de grandes figuras democratas, como os Clinton, obrigará a estrutura partidária a conceder-lhe o seu apoio incondicional na eleição geral, onde não terá hipóteses de vencer contra o republicano Marco Rubio e o independente Charlie Crist. Se tivesse sido Greene o vencedor, os democratas poderiam apoiar Crist mais abertamente e esperar que o actual governador da Florida se juntasse a eles no Senado. Assim, o eleitorado moderado e liberal dividirá o seu voto entre Crist e Meek, aumentando exponencialmente as chances de vitória de Rubio.
Mas a grande surpresa da noite deu-se nas primárias do GOP para governador da Florida, com a vitória de Rick Scott sobre o favorito Bill McCollum. McCollum era visto como o candidato natural do GOP, com passado no partido e no Estado - foi congressista, duas vezes candidato ao Senado e Procurador-Geral da Florida. Mas Scott, que entrou tardiamente na corrida, veio alterar a situação e, com recurso à sua fortuna, bateu todos os recordes de dinheiro gasto numa campanha (39 milhões de dólares) e atacou, com sucesso, McCollum, caracterizando-o como um político de carreira, à velha maneira de Washington. 
Contados os votos, fica mais definido o cenário eleitoral para as midterms de Novembro, mas as primárias ainda vão continuar por mais um mês, até ao final de Setembro. Por essa altura, teremos uma melhor noção do que poderá acontecer. Por agora, a situação continua muito, muito desfavorável para os democratas.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Uma derrota democrata é uma derrota para Obama?

Em cada ano de eleições intercalares é norma associar-se os resultados desse importante momento eleitoral à prestação do presidente em exercício na Casa Branca. 2010 não é excepção e, apesar do nome de Barack Obama não constar dos boletins de voto nas eleições que se aproximam, a verdade é que os resultados de  2 de Novembro, irão, pelo menos em parte, ser lidos como se um referendo à presidência de Obama se tratasse. Assim, os previsíveis maus resultados para os democratas nas midterms representarão sempre uma pesada derrota para o líder do Partido Democrata. Contudo, esse revés eleitoral, poderá não ser uma má notícia para Barack Obama. 
Actualmente, os democratas controlam a Casa Branca e têm largas maiorias nas duas câmaras do Congresso. Mas, após as eleições intercalares, o partido de Obama poderá perder o controlo da Câmara dos Representantes e irá, certamente, ver a sua maioria no Senado reduzir-se substancialmente (a recuperação da câmara alta por parte do GOP é improvável), o que impedirá os democratas de anular qualquer fillibuster republicano. Desta forma, Obama e os democratas terão de procurar acordos e entendimentos com a oposição republicana, de forma a conseguir apoios e votos suficientes para fazer passar as suas propostas no Congresso. Se o conseguirem - e é obrigatório que o façam - isso envolverá o Partido Republicano no processo político e legislativo, reduzindo, pelo menos em parte, o ónus da governação dos democratas, que não serão, então, os únicos a terem de assumir as responsabilidades pelo estado da nação e, principalmente, da economia diante dos cidadãos americanos.

Num cenário deste género, Barack Obama poderia assumir uma postura mais presidencial, deixando de lado a figura de líder do partido que controla totalmente a administração federal, para passar a representar o papel de figura unificadora e conciliadora de Presidente dos Estados Unidos da América, indispensável para conseguir acordos entre os dois partidos no Congresso. Estaria assim lançada a sua recandidatura e facilitada a sua campanha presidencial de 2012.

Mas, mesmo aceitando que as suas hipóteses de reeleição saíssem reforçadas com uma derrota democrata nas eleições para o Congresso que se aproximam (no caso dos governadores a história é outra), Obama não deixará de ser fiel e leal ao seu partido, ajudando, naquilo que estiver ao seu alcance, os candidatos democratas no trilho da campanha. Dessa forma, estará também a ajudar-se a si próprio, pois dentro em breve será ele próprio a precisar do apoio da estrutura partidária e dos democratas na sua batalha por um segundo mandato.

sábado, 21 de agosto de 2010

Cartoon: A "mesquita" da polémica

Mais um cartoon bem esgalhado da autoria de M. Werner, do Politico, retratando a polémica que se gerou à volta de um centro islâmico nas proximidades do local onde se situava o World Trade Center e que, entre outras valências, irá contar com uma mesquita. Só que, como o desenho aponta, o edifício ficará situado a dois quarteirões do Ground Zero, rodeado de vários estabelecimentos comerciais e, ao que parece, muito próximo de uma casa de strip.
A verdade é que este assunto, que já fez correr muita tinta, continua na ordem do dia e promete estar para ficar, tendo adquirido o estatuto de tema internacional, após as declarações do presidente americano, Barack Obama que, à custa desta matéria, conseguiu arranjar um novo problema. Depois de, como referi anteriormente, ter defendido a construção deste centro islâmico, voltou atrás no dia seguinte, dizendo que apenas tinha dado uma posição do ponto de vista legal. Contudo, depois do seu flip-flop ter sido criticado, a Casa Branca sentiu a necessidade de clarificar que o presidente não se tinha afastado da sua primeira declaração.
Obama quis vir a público fazendo uma declaração de princípios, o que é aceitável. O que já não é tão aceitável é que faça constantes zigue-zagues políticos e ideológicos, consoante a opinião pública e as sondagens. Esta trapalhada volta a pôr a nu os problemas que a actual administração tem sentido ao nível da comunicação. Este é um dado ainda mais estranho quando nos recordamos da fantástica campanha presidencial montada por Obama e pelos seus mais próximos conselheiros, que conseguiu pôr a América e o mundo a sonhar com a promessa de mudança nas políticas de Washington. Promessa essa que continua por cumprir.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Entrevista ao Histórias da Casa Branca

No âmbito da rubrica "Histórias da Casa Branca", incluída na secção "Outros Mundos" do site do jornal "A Bola", o jornalista e colega blogger Germano Almeida entendeu por bem entrevistar-me, em jeito de balanço dos primeiros 18 meses de Barack Obama na Casa Branca.
Ao longo da entrevista, dou a minha opinião sobre as vitórias e derrotas da administração Obama, as suas hipóteses de reeleição para 2012, os seus principais oponentes nas próximas eleições, entre outros. Mas o melhor é mesmo lerem o conteúdo na integra e, por isso, aqui ficam os links:
Por fim, não posso deixar de agradecer ao Germano Almeida o interesse que demonstrou em ouvir-me e a oportunidade que me proporcionou.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

A corrida pelas mansões dos governadores

O mapa actual: Azul (D) Vermelho (R)
Faltam menos de três meses para as eleições intercalares e tendo seguido regularmente as eleições para o Senado e feito já referência à luta pela Câmara dos Representantes, falta, então, abordar as corridas por cargos de governadores estaduais que irão ser também decididas no próximo dia 2 de Novembro.
Este ano, os eleitores de 37 dos 50 Estados federados americanos irão a votos para escolher o seu governador estadual, fazendo de 2010 um ano que promete alterar o mapa político norte-americano relativamente aos governos dos Estados. Actualmente, os democratas contam com 26 governadores, contra 23 republicanos e o (agora) independente Charlie Crist na Florida.Contudo, e à imagem do que acontece nas eleições para o Congresso, também aqui os republicanos podem esperar obter ganhos importantes. Segundo o Real Clear Politics, o Partido Democrata conta com 15 cargos de governador seguros (contando com os que não vão a votos), enquanto o GOP tem 24 certos na sua coluna. Isto deixa 11 Estados com desfecho imprevisível e onde a vitória pode cair para qualquer lado. Visto isto, parece claro que o Partido Republicano irá conseguir ganhar, pelo menos, uma mão cheia de governadores aos democratas.
Todavia, além do número de Estados que o GOP pode roubar aos democratas, interessa ainda perceber quais são. Entre os Estados em perigo para o partido de Obama contam-se alguns dos mais importantes, como o Illinois, a Califórnia, a Pennsylvania, o Ohio e o Michigan. Assim, ver um político do seu partido abandonar  mansão do governador em qualquer um destes Estados representa uma pesada derrota para os democratas.
E, para piorar o cenário para o Partido Democrata, o problema de perder governadores estaduais tem ainda implicações relevantes na corrida pela reeleição de Barack Obama em 2012. É certo e sabido que o Governador é o principal organizador político no seu Estado, angariando votos, apoio, dinheiro e colocando a sua máquina política a trabalhar em prol do candidato presidencial do seu partido. Desta forma, também aqui, os democratas podem ficar em clara desvantagem, se perderem o controlo de Estados decisivos em eleições presidenciais, como são o caso do Ohio e da Pennsylvania.
Sendo assim, continuam as más notícias para o partido que entre 2006 e 2009 não conheceu o sabor da derrota e alterou totalmente o panorama político dos Estados Unidos. Porém, parece que, pelo menos por agora, os republicanos conseguiram alterar a maré, beneficiados pela lenta recuperação económica americana e que em Novembro poderá ser a sua vez de obterem um triunfo histórico em todas as frentes.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

A 18 meses do Iowa

Quando estamos a sensivelmente ano e meio de distância do caucus do Iowa, o primeiro e decisivo acto do processo de primárias, a situação no campo republicano continua bastante tranquila, com o leque de candidatos a candidatos a pretender adiar ao máximo o pontapé de saída na campanha eleitoral para as presidenciais de 2012. Contudo, além de "incontornáveis", como Sarah Palin, Mitt Romney ou Mike Huckabee, outros nomes começam a surgir com mais insistência, como são os casos de Mitch Daniels, Haley Barbour ou John Thune.
Os concorrentes ao lugar actualmente na pertença de Barack Obama estão, então, a aguardar o desfecho das eleições intercalares de Novembro, mas isso não impede que continuem a surgir sondagens sobre as primárias do GOP que irão decidir quem desafiará Obama na eleição geral. Saiu hoje um novo estudo de opinião, da autoria do The Iowa Republican, que coloca Mike Huckabee na frente da corrida  no Iowa com 22% dos votos, ficando Romney a 4 pontos percentuais, Newt Gingrich (algo surpreendentemente) em terceiro com 14% e só depois Palin com 11% das intenções de voto. No campeonato dos pequenos, o libertário Ron Paul consegui 5%, enquanto Tim Pawlenty e John Thune quedaram-se pelo 1%.
A vitória de Huckabee não surpreende, visto que o antigo governador do Arkansas foi o vencedor do caucus do Iowa em 2008, mas estes números permitem tirar algumas indicações, especialmente a má prestação de Sarah Palin e o bom resultado de Gingrich. Fazendo um pouco de futurologia, é provável que após os dois primeiros momentos das primárias - o caucus do Iowa e as primárias de New Hampshire - a corrida esteja em grande parte limitada a dois candidatos principais: um moderado, como Romney ou Pawlenty, e um representante da ala mais conservadora do GOP, como Palin, Huckabee ou Gingrich. Desta feita, tendo em conta que Mitt Romney é o grande favorito no New Hampshire, Estado vizinho do seu Massachusetts, o Iowa assume-se como o momento-chave para os candidatos mais conservadores. Assim, estes números não são nada animadores para Sarah Palin, mas, por outro lado, podem entusiasmar Gingrich a uma eventual candidatura.
Claro que estas sondagens têm um valor limitado, numa altura em que ainda não há candidatos oficiais e em que as grandes figuras beneficiam do facto de o seu nome ser reconhecido pela maioria, enquanto que possíveis outsiders, como Pawlenty ou Mitch Daniels, pouco conhecidos a nível nacional, podem vir a beneficiar de uma campanha de proximidade, como é norma no Iowa. De qualquer forma, é sempre bom irmos vendo alguns dados, que comecem a abrir o apetite para as importantes e emocionantes decisões que estão para vir.

sábado, 14 de agosto de 2010

A mesquita do Ground Zero

Os projectos de construção de um centro islâmico e de uma mesquita no centro de Manhattan, perto do Ground Zero, o local onde se encontrava o World Trade Center, destruído pelos ataques terroristas do 11 de Setembro, continuam na ordem do dia. Este é um tema sensível, com os detractores deste plano a insurgirem-se contra a instalação de um local de culto da religião islâmica, que era a praticada (de forma radical) pelos terroristas que, em 2001, atacaram os centros financeiro e militar da América, tirando cerca de três milhares de vidas.
Do lado republicano, sempre apostado a mostrar-se empenhado  e forte em temas de segurança nacional, figuras como Sarah Palin ou Newt Gingrich quase se atropelam para protestar contra tal projecto, enquanto que o candidato do GOP à mansão de governador de Nova Iorque, Rick Lazio, tem feito do tema uma das sua principais bandeiras de campanha. Aliás, a única surpresa é não termos ouvido mais de Rudy Giuliani  (Mayor de Nova Iorque na altura dos atentados) que, durante a sua desastrosa candidatura presidencial, praticamente monopolizou qualquer assunto relacionado com o 11 de Setembro.
Mais surpreendente foi a corajosa posição de Barack Obama que, por ocasião do jantar comemorativo  do Ramadão na Casa Branca, defendeu a concretização do projecto, lembrando que a primeira emenda à Constituição americana institui a liberdade de culto sem distinções entre religiões. Esta postura, assumida numa apropriada ocasião, é uma pedrada no charco no panorama do Partido Democrata, já que a maioria dos políticos deste partido tem optado por se manter afastado desta tão complicada questão, ainda para mais quando esta ocorre tão perto de um período eleitoral.
Quanto a mim, penso que impedir a construção deste centro islâmico em Manhattan, que além da mesquita contará com outras instalações, como uma biblioteca, um restaurante, um auditório e um ginásio, seria uma grande machadada no ideal americano, um país fundado por imigrantes que fugiam, eles próprios, da perseguição religiosa nos seus países de origem. Além disso, é errado associar a grande religião islâmica à minoria radical que apoiou e concretizou os bárbaros actos de há nove anos atrás. Na verdade, tal proibição, além de carecer totalmente de qualquer base legal, consistiria numa vitória para os terroristas de Bin Laden, que, assim, teriam conseguido minar com sucesso a essência dos Estados Unidos da América.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Obama=Bush?

A principal mensagem da campanha presidencial vitoriosa de Barack Obama foi a mudança e o corte total com os oito anos de administração Bush, que haviam levado a América a duas guerras impopulares e a uma crise financeira sem precedentes desde a Sexta-feira Negra de 1929. Contudo, decorridos os primeiros 18 meses de Obama na Casa Branca, muitos activistas e organizações liberais americanas estão desiludidas com o presidente que ajudaram a eleger, e alguns dos mais radicais afirmam mesmo que Obama parece George W. Bush.
Porém, se virmos bem as coisas, é por demais evidente que Obama é um presidente bastante diferente de Bush e, além disso, é preciso ter em conta que uma coisa é o que as pessoas esperavam de Obama e outra bem diferente foi aquilo que o próprio prometeu durante a campanha. Vejamos as questões de política externa: se os americanos mais liberais esperavam um retirada total dos dois teatros de guerra é porque não estiveram atentos à campanha de Obama, que sempre prometeu o desvio de atenções e recursos do Iraque para o Afeganistão. Mas terá sido, porventura, no Iraque que a estratégia do actual presidente menos diferiu da do seu antecessor, mas, de qualquer forma, procedendo à retirada gradual da presença militar norte-americana no país outrora dominado por Saddam Hussein. A sua grande falha terá sido mesmo em relação à prisão de Gauntanamo Bay, que ainda não conseguiu encerrar, ao contrário do que prometeu durante a campanha.
A nível de política interna as diferenças são notórias. Apesar de Obama ter herdado e dado continuidade ao bailout iniciado por Bush, foi ainda mais longe e conseguiu aprovar uma reforma financeira com vista a evitar uma nova crise como a que se despoletou em 2008. Ainda relativamente a questões económicas, Obama rompeu totalmente com o 43º presidente, pondo um fim aos cortes fiscais para os mais ricos, uma das imagens de marca de Bush. Depois, a histórica reforma da saúde foi, sem dúvida, o momento mais importante da presidência de Obama até ao momento. Pode não ter ido tão longe como a facção mais à esquerda do Partido Democrata desejaria, mas, dadas as circunstâncias e a feroz oposição republicana, esta reforma foi a possível e, ainda assim, um tremendo avanço do welfare state norte-americano. Por fim, as duas nomeadas por Obama para o Supremo Tribunal mantiveram o equilíbrio ideológico da Instituição, além de Sonia Sottomayor se ter tornado a primeira latina na mais alta instância jurídica dos Estados Unidos.
Vistas bem as coisas, não me parece que a Esquerda americana tenha motivos suficientes para estar tão insatisfeita com Obama quanto isso. Ao contrário do que muitos quiseram dar a entender (como Hillary Clinton durante as primárias, ou os republicanos desde 2008), Obama não é um radical liberal, mas sim um moderado. Pode não ser um centrista como Bill Clinton, mas também não é um Walter Mondale ou um George McGovern. E não é, certamente, um George W. Bush.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

A ajuda improvável

Michael Bennet com Obama
O actual clima político nos Estados Unidos tem sido entendido como extremamente favorável aos republicanos, em detrimento dos democratas, que se encontram no poder, tanto na Casa Branca, como nas duas câmaras do Congresso. Assim, têm sido antecipados grandes ganhos eleitorais nas próximas eleições legislativas de Novembro.
Contudo, o peso crescente da ala mais conservadora do Partido Republicano, com especial destaque para o Tea Party, tem atraído o GOP para a direita e isso traduz-se nas primárias do partido, onde candidatos mais conservadores têm derrotado outros que seriam mais facilmente eleitos na eleição geral. Se este facto foi observado, por exemplo, no Nevada, onde a nomeação de Sharron Angle deu um novo fôlego a Harry Reid, que até aí era visto como presumível derrotado,  ontem, nas primárias republicanas para o Senado pelo Colorado, o cenário repetiu-se, com a escolha de Ken Buck, mais um candidato alinhado com a facção mais conservadora do partido e que certamente proporcionará aos democratas a oportunidade de o caracterizarem como um radical de direita.
Por outro lado, as primárias do Colorado devem ter feito o presidente Obama e a liderança suspirarem de alívio. Aqui, ao contrário do que aconteceu na Pennsylvania e do que quase se passou no Arkansas, o vencedor das primárias foi o senador que procura a reeleição, no caso, Michael Bennet, que derrotou Andrew Romanoff, por uns surpreendentes oito pontos percentuais, numa disputa que se pensava ir ser bem mais renhida. Este resultado é o mais cómodo para o Partido Democrata, visto que uma derrota do candidato apoiado pela estrutura do partido sublinharia ainda mais o cenário anti-establishment e anti-Washington do ciclo eleitoral que se aproxima. 
Assim, apesar do actual clima político ser muito prejudicial aos democratas e de parecer certo que a economia americana não irá recuperar substancialmente até às próximas eleições, a verdade é que os previsíveis grandes ganhos eleitorais do GOP poderão ser minimizados por resultados como os do Nevada e do Colorado, onde os eleitores republicanos nomearam candidatos muito conservadores, ajudando, dessa forma, as perspectivas eleitorais dos seus opositores democratas nas eleições gerais. Assim se percebe que, num cenário eleitoral extremamente negativo para os democratas, a sua maior ajuda parece vir precisamente do lado republicano.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

O casamento homossexual regressa à ribalta

A 4 de Novembro de 2008, no mesmo dia em que Barack Obama foi eleito o 44º presidente da história americana, os eleitores da Califórnia optaram, em referendo, por impedir o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Contudo, agora, um juiz de São Francisco (where else?) veio declarar que esse impedimento viola a Constituição americana, anulando, assim, a denominada Proposition 8, que os californianos haviam aprovado nas urnas.
Nos Estados Unidos, onde a maioria da população não é favorável ao casamento homossexual, cabe aos Estados federados legislar sobre esta matéria. Apenas cinco dos 50 Estados têm leis que o permitem (Iowa, Massachussetts, Vermont, New Hampshire e Connecticut). Assim, a permissão deste tipo de casamento no maior Estado da União é uma importante vitória para os activistas dos direitos dos LGBT.
Além disso, esta decisão veio relançar a discussão em torno de um tópico que andava, nos últimos tempos, ausente dos tópicos principais da política americana e traz alguns problemas ao presidente do país. Obama tem nesta questão uma posição algo dúbia e pouco clarificadora: assume-se como opositor do casamento homossexual, (apesar de ser favorável a uniões civis) mas também veio mostrar-se desfavorável a iniciativas como a da Proposition 8, que visam a discriminação de minorias através da alteração das constituições estaduais. Assim, a questão da Califórnia traz à baila um tema em que Obama não se sente à vontade.
Quem não pode deixar de estar satisfeito pelo regresso desta questão às luzes da ribalta são os activistas pró e contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo, que defendem sempre aguerridamente os seus ideais. Contudo, é duvidoso que a questão dos casamentos homossexuais ganhe tracção e se torne num dos grandes temas da campanha para as eleições de Novembro. Com a lenta recuperação económica, os elevados valores de desemprego, a guerra no Afeganistão, as reformas da saúde e do sector financeiro e muitos outros assuntos de destaque, esta questão parece bastante secundária.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Justice Kagan

Está muito próxima a confirmação pelo Senado de Elena Kagan como a mais recente adição ao Supremo Tribunal norte-americano, a mais alta e importante instituição judicial dos Estados Unidos. Assim, ao que tudo indica, Obama vai conseguir colocar no Supremo a sua segunda nomeada, depois de, em 2009, também Sonia Sottomayor ter sido confirmada pela câmara alta do Congresso.
Porém, o processo de confirmação de Kagan foi mais tranquilo e facilitado do que o de Sottomayor e o da maioria dos nomeados para um cargo vitalício entre os nove juízes do Supremo Tribunal. Várias razões contribuíram para que assim fosse. Em primeiro lugar, a atenção mediática concedida à confirmação de Elena Kagan foi menor do que é habitual nestas situações, dado o grande número de acontecimentos de relevo que se desenrolaram em simultâneo (com o derrame de crude no Golfo do México à cabeça), mas também porque se assistiu a uma certa saturação de nomeações para o Supreme Court nos últimos tempos (foram cinco nos últimos cinco anos). 
Em segundo lugar, não houve grandes polémicas em torno do passado e do pensamento ideológico de Kagan, que tinha a vantagem de não ser juíza e, dessa forma, não ter um historial de decisões em tribunal que seriam, certamente, dissecadas ao pormenor pela minoria republicana. A única controvérsia que se gerou foi relacionada com uma sua decisão nos tempos em que era reitora de Harvard, por ter proibido o recrutamento militar no campus da Universidade. Contudo, nem esse assunto foi muito explorado pela oposição. 
Por isso, deverá estar para breve a sua confirmação como juíza do Supremo Tribunal, contando mesmo com  pelo menos quatro votos favoráveis por parte da bancada republicana. No fundo, a  confirmação de Kagan traz vantagens tanto para democratas como para republicanos: enquanto Obama e o seu partido conseguem uma fácil vitória, o GOP garante que o equilíbrio ideológico da mais alta instância jurídica americana não se desloca mais para a Esquerda, pois Elena Kagan substitui John Paul Stevens (passa à reforma), que era considerado o "leão liberal" do Supremo Tribunal. É, então, um processo tranquilo com um final "simpático" para os dois lados da barricada.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

2012: Obama-Hillary?

Joe Biden não foi um nome consensual quando Barack Obama o escolheu para seu running mate na corrida para a Casa Branca em 2008. Na altura, muitos consideraram que ter Biden como VP minava a mensagem de esperança e mudança que a campanha de Obama apregoava. Contudo, a necessidade de sossegar o eleitorado preocupado com a falta de credenciais de Obama nas matérias de relações externas e de atrair os blue collar workers, que nas primárias democratas tinham preferido Hillary Clinton, levaram o futuro presidente a optar por Joe Biden.
Mas a vice-presidência do antigo senador pelo Estado de Delaware não tem  sido propriamente famosa. Ainda recentemente, uma sua visita a um dos Estados mais afectados pelo derrame de crude e um dos mais importantes battlegrounds na política americana, a Florida, foi um autêntico desastre. Consequentemente, já algumas vozes se começam a ouvir em defesa de uma mudança no ticket democrata para 2012. A última é a do antigo governador da Virgínia e o primeiro governador afro-americano eleito da história dos Estados Unidos, L. Douglas Wilder, que, num artigo de opinião publicado no Politico, aconselha Obama a trocar Joe Biden por Hillary Clinton na vice-presidência de um seu eventual segundo mandato.
Tal cenário parece-me pouco provável de vir a suceder. Primeiro, porque forçar Biden a abdicar do seu cargo será sempre bastante complicado, a menos que algo de anormal aconteça. O passado já provou que o actual VP é um homem de ideias próprias e que por vezes tem dificuldades em ser um bom jogador de equipa. Depois, porque a troca em causa transmitiria a impressão de uma mera jogada político-eleitoral que poderia manchar ainda mais a imagem do presidente.
Por outro lado, a vice-presidência poderia ser um grande catalisador para a candidatura de Hillary Clinton à presidência americana em 2016. Sendo pouco provável que a esposa de Bill Clinton continue no Departamento de Estado por mais um mandato, esta seria uma excelente oportunidade para Hillary se manter no centro do poder político americano e continuar a elevar o seu perfil mediático. Apesar de em Novembro de 2016 a actual Secretária de Estado norte-americana contar já com 69 anos, é bem possível que Hillary tente novamente cumprir o seu grande sonho de ser a primeira mulher presidente americana. Caso contrário, poderá ser a filha do casal mais poderoso do mundo, Chelsea Clinton, a herdar esse objectivo.