terça-feira, 17 de março de 2020

O fim da estrada para Bernie Sanders

A pandemia do Covid-19 está a paralisar praticamente o mundo todo (em especial o hemisfério Norte) e os Estados Unidos já não são excepção, desde que a administração Trump fez meia-volta e declarou este corona vírus como uma grande ameaça à saúde pública. 
Naturalmente, numa situação de emergência como esta, até às importantes eleições primárias ficam para segundo plano e podem mesmo ficar numa espécie de stand-by, pelo menos até se ultrapassar a pior fase desta epidemia. 
No passado Sábado, decorreu um debate televisivo entre Joe Biden e Bernie Sanders, os dois últimos candidatos (além da irrelevante Tulsi Gabbard) à nomeação presidencial pelo Partido Democrata. Como não podia deixar de ser, o tema Covid-19 ocupou grande parte da discussão, o que levou, com naturalidade, a que os dois concorrentes esgrimissem argumentos sobre as sua visões para o serviço de saúde norte-americano. Sanders, um defensor acérrimo de um serviço de saúde universal, à europeia, colidiu com a visão mais "americana" de Biden, que apoia um serviço de saúde prestado por privados, reforçando as medidas de regulação e protecção criadas pelo Obamacare.
Além disso e de alguma discussão em torno do historial de voto de Joe Biden, que terá sempre alguma dificuldade em defender o seu perfil moderado no Senado numa época em que os democratas são significativamente mais progressistas do que até há 12 anos, quando Biden abandonou a câmara alta, o debate de Sábado pouco acrescentou. A maior novidade terá sido mesmo o anúncio de Biden de que escolherá uma mulher para sua vice-presidente. Surpreendido pela decisão do seu adversário, Sanders praticamente prometeu fazer o mesmo, pelo teremos um ticket misto do lado democrata.
Hoje mesmo decorrerá uma nova ronda de primárias, ainda que com uma baixa. Com efeito, o governador republicano do Ohio decidiu suspender as primárias no seu Estado, apesar de uma decisão judicial em sentido contrário, por causa do epidemia do Covid-19. Pode parecer uma decisão sensata, mas é sempre preocupante vermos um político a cancelar uma eleição (ainda por cima do partido oposto ao seu) indo contra uma decisão de um tribunal, pondo em causa o sistema de checks and balances da democracia norte-americana. 
Com esta decisão no Ohio, teremos primárias apenas na Florida, Arizona e Illinois e é expectável que Joe Biden vença facilmente os três estados. Depois disso, devemos entrar numa fase de suspensão das primárias, dado que muitos estados já anunciaram o adiamento da sua primária por causa do novo coronavirus. Fica, por isso, muito complicada a candidatura de Sanders, que, depois de hoje, deverá ver a sua distância para Biden em número de delegados alargar-se ainda mais. Para piorar a situação, foi hoje anunciado que foi o antigo VP de Obama a vencer no estado de Washington.
Assim, com a campanha prestes a entrar numa espécie de letargia, Bernie Sanders fica sem estrada para poder esperar por uma espécie de milagre que surgisse no percurso e trouxesse uma enorme reviravolta e o recolocasse na disputa pela nomeação. Nesta altura, não se sabe sequer em que moldes decorrerá a convenção nacional democrata, agendada para Julho. Resta, por isso, esperar para ver o que acontece nos próximos tempos que são, sem dúvida, extraordinários.

sábado, 14 de março de 2020

Xeque-mate

A não ser que algo de muito extraordinário aconteça - e vivemos tempos em que temos de estar preparados para tudo -, Joe Biden será o nomeado presidencial do Partido Democrata e defrontará Donald Trump na eleição geral de Novembro. Apesar de Bernie Sanders ainda se manter na corrida, o resultado final está praticamente definido, tendo em conta a vitoriosa noite de Biden na passada Terça-feira.
Depois das vitórias do ex-vice-presidente na Carolina do Sul e na Super Tuesday, Sanders não tinha motivos para estar optimista e os resultados vieram tornar realidade as previsões mais negras para  campanha do Senador pelo Vermont. Já se sabia que o Sul não era terreno favorável a Bernie, mas a derrota no Mississippi por 65 pontos percentuais foi, no mínimo, embaraçosa e pôs a nu, mais uma vez, as dificuldades de Sanders junto do eleitorado afro-americano. No Missouri, Joe Biden obteve mais uma vitória folgada, demonstrando que conta também com o apoio dos eleitores dos subúrbios e do heartland dos Estados Unidos. Também no Idaho, numa pequena primária que elegia apenas 20 delegados, foi Joe o vencedor, ainda que por uma margem mais curta, mas num estado que, há pouco tempo, parecia seguro para Bernie Sanders.
Contudo, o grande prémio da noite era o Michigan e, aí, num dos principais estados industriais da nação norte-americana, Joe Biden terá dado um verdadeiro tiro no porta-aviões da campanha de Sanders, com uma vitória clara e inequívoca que prova que Bernie, ao contrário de há quatro anos, não conta com uma maioria de apoiantes entre os blue collar workers da zona industrial dos Estados Unidos e que, como em 2016, poderão decidir a eleição geral de Novembro. 
Como fraco prémio de consolação, Sanders conseguiu vencer no Dakota do Norte e está à frente no estado de Washington por 2% dos votos quando ainda faltam contar 5% do total de boletins. O equilíbrio da corrida neste último estado é a prova de que o senador do Vermont está em queda livre, pois será difícil encontrar um estado demograficamente mais favorável à sua candidatura - Washington é um dos Estados com uma população mais jovem, instruída, urbana e liberal da União.
Após estes resultados, não existe mais um percurso viável que se possa vislumbrar e que leve à nomeação de Bernie Sanders. A próxima ronda de primárias é-lhe particularmente desfavorável, dado que os quatro importantes estados (Florida, Ohio, Illinois e Arizona) que vão a votos na próxima terça-feira (se o Covid-19 deixar) devem cair todos para o lado de Biden. Assim, e se as primárias desta semana representaram o "cheque ao rei" para a campanha de Bernie, as próximas eleições deverão significar o "cheque-mate".
Todavia, o senador de 78 anos decidiu manter-se na corrida e participar no debate de Domingo. Com uma fiel e dedicada legião de apoiantes e com dinheiro ainda na conta bancária, Sanders não quererá desistir demasiado cedo de uma corrida que já deu uma grande reviravolta e num ambiente dominado pela incerteza que a crise do Covid-19 veio acentuar. Ainda assim, estará ciente que tem pela frente uma tarefa praticamente impossível e deverá começar a refrear o tom do seu discurso e a reduzir a crispação da campanha, de forma a preparar o seu eventual apoio a Joe Biden. 
Sanders, que desdenha Donald Trump e até tem alguma simpatia pessoal por Biden, não quererá contribuir para a reeleição do actual presidente e terá de evitar o que aconteceu há quatro anos, quando os seus apoiantes se revoltaram contra a nomeada democrata, Hillary Clinton, chegando mesmo a perturbar a convenção nacional do partido. Por isso, os próximos tempos deverão ser de transição, de uma campanha activa para a gradual aproximação e inevitável endorsement a Joe Biden, de forma e unir o Partido Democrata e começar a derrotar Donald Trump.

quinta-feira, 12 de março de 2020

Trump enfrenta a pandemia

Donald Trump dirigiu-se, ontem, à nação norte-americana para apresentar novas medidas de combate à pandemia provocada pelo Covid-19. Em destaque, esteve a interdição de voos provenientes do Espaço Schengen durante os próximos trinta dias. 
Se há poucos dias o Presidente norte-americano via o surto do coronavírus como uma farsa promovida pelos democratas para minar a economia do país, Trump parece agora ter-se rendido às evidências e aos pedidos das comunidades médicas e científicas para que encarasse esta ameaça com a seriedade e urgência necessárias. 
Contudo, a comunicação do Presidente não ficou isenta de críticas, internas ou externas. No seio do seu país, Trump foi censurado por não ter sido suficientemente claro e objectivo, o que gerou bastante confusão. Por esse motivo, Mike Pence, que lidera a task force de combate à epidemia, teve de vir hoje a público clarificar alguns pontos e desenvolver a explicação sobre as medidas previstas pela administração. Por outro lado, o facto de esta decisão não ter sido previamente discutida e analisada com os parceiros europeus, resultou numa reacção enérgica por parte dos líderes europeus, que acusam Donald Trump de unilateralismo, numa altura em que o perigo da pandemia obriga a uma reposta concertada a nível global. Depois, o facto de o Reino Unido - que não pertence ao Espaço Schengen - ter ficado de fora da interdição, levou a que alguns quadrantes considerassem que Trump está a fazer política e a premiar o brexit, processo que sempre defendeu. 
Independentemente destas questões, a noite de ontem marcou, definitivamente, uma nova fase na forma como a Casa Branca encara esta pandemia. Após muitas semanas a desvalorizar o problema, Trump tem agora noção que o problema é bastante real e que terá um enorme impacto, inclusivamente para a questão da sua reeleição. O seu discurso e as medidas já anunciadas e/ou adoptadas revelam isso mesmo. A campanha de reeleição do Presidente anunciou até o cancelamento de comícios, algo que Trump vinha sempre a negar poder acontecer.
Ainda é cedo para perceber a dimensão da epidemia, no que diz respeito ao número de vítimas, mas é certo que se continuarão a perder vidas e que o presidente dos Estados Unidos é sempre julgado pela forma como reage a uma tragédia. Basta recordar o que o furacão Katrina representou para a presidência de George W. Bush para percebermos que, caso a resposta da administração não seja vista como eficaz e adequada pelo público, Donald Trump poderá ter grandes dificuldades em ser reeleito. Além disso, as consequências inevitáveis e profundas para a economia norte-americana podem retirar ao actual ocupante da Sala Oval aquele que era visto como o seu principal trunfo para Novembro: a pujança económica do país. 
No fim de contas, as consequências político-eleitorais do Covid-19 são insignificantes e irrelevantes quando comparadas com as trágicas perdas de vidas e até com a provável recessão económica que se seguirá à epidemia. Contudo, elas existirão e merecem, também, serem acompanhadas. Haja saúde para o fazer.

terça-feira, 10 de março de 2020

All eyes on Michigan

Depois da Super Tuesday da semana passada, hoje temos uma Mini Tuesday, com seis estados a irem a votos. Mais logo, os eleitores do Idaho, do Michigan, do Mississippi, do Missouri, do Dakota do Norte e de Washington (não confundir com a capital federal) deslocam-se às urnas para eleger os nomeados presidenciais. Como Donald Trump tem a nomeação garantida, interessa o que se passa do lado democrata, numa altura em que restam Joe Biden e Bernie Sanders a disputar a vitória nas primárias democratas.
Renascido na Carolina do Sul e arrasador na Super Tuesday, Biden parece lançado para a nomeação e o 538 de Nate Silver já atribui 99% de possibilidades de triunfo ao antigo vice-presidente. Assim, Bernie Sanders está obrigado a fazer um grande resultado nas corridas de hoje para que a sua candidatura se mantenha viável. Contudo, as atenções estarão principalmente para o Michigan, o maior dos estados em disputa e que entrega mais de um terço - 125 - do s 352 delegados em jogo na noite de hoje.
Há quatro anos, quando Bernie competiu com Hillary Clinton pela nomeação presidencial, o Michigan também era apontado como um estado decisivo. Nessa altura, e quando Hillary surgia com uma enorme vantagem nas sondagens, foi o senador pelo Vermont a surpreender e a levar a melhor no estado dos Grandes Lagos. Essa vitória deu um novo fôlego à candidatura de Bernie e prolongou as primárias democratas que só terminaram na convenção nacional do partido. 
Sanders esperará que a história se repita e que o Michigan troque, uma vez mais, as voltas às sondagens e aos pundits, criando uma nova reviravolta numa corrida que já pareceu estar perto de vencer. Contudo, 2020 não é 2016 e, nesse ano, Hillary Clinton tinha muitos anti-corpos na classe operária branca, algo que já não acontece com Joe Biden. Há quatro anos, a abstenção democrata no Michigan foi elevadíssima, o que contribuiu para o falhanço de todas as sondagens e para a vitória inesperada de Bernie. Este ano, com os democratas motivados para derrotar Trump, isso não deverá acontecer e a forte mobilização do eleitorado de Sanders poderá não ser suficiente.
O Michigan será, então, o maior prémio da noite, mas não será o único. Em segundo lugar, o estado de Washington, com os seus 89 delegados, também será muito importante e Bernie e Joe parecem estar virtualmente empatados no estado norte-americano mais afectado pelo Coronavirus, o que pode baralhar as contas. Mais a sul, no Missouri (68 delegados) e no Mississippi (36), a vitória não deverá fugir a Biden, que conta com grande vantagem entre o eleitorado afro-americano. Por fim, temos os pequenos Idaho (20) e Dakota do Norte (14), pouco relevantes e onde praticamente não existem sondagens, ainda que se tenha de atribuir uma pequena vantagem ao antigo Veep, em especial neste último.
Tudo aponta, por isso, que a noite de hoje será muito importante para a corrida pela nomeação democrata. Se Joe Biden vencer em toda a linha, com vitórias no Michigan e em Washington a juntar aos esperados triunfos nos estados sulistas, tornar-se-á o presumível nomeado e Bernie Sanders começará a ser pressionado para abandonar a favor do seu adversário para unir o partido. Pelo seu lado, o senador do Vermont terá de triunfar, contra todas as probabilidades, pelo menos no Michigan e, de preferência, também em Washington para ainda poder sonhar em defrontar Trump em Novembro. Mais logo, veremos qual dos cenários se concretiza.

sábado, 7 de março de 2020

Bernie can't win?






















Costuma-se dizer que os generais estão sempre preparados para travar a guerra anterior e não a próxima. Mas isso acontece também com os analistas políticos que anteveem a próxima eleição com base nas anteriores. Eu mesmo cometi esse erro há quatro anos quando menosprezei as hipóteses de vitória de Donald Trump. Da mesma forma, este ano, são muitos aqueles que defendem que Bernie Sanders não tem possibilidades de derrotar o actual ocupante da Sala Oval numa eventual disputa pela presidência. Larry Sabato, por exemplo, defende que se for Bernie o nomeado, Trump será favorito à vitória.
Na verdade, a maioria das sondagens até têm tendência para apontar no sentido contrário, pois  nestes estudos de opinião Sanders tem sido, de uma forma geral, o candidato democrata a conseguir melhores resultados num frente-a-frente virtual com Trump. Porém, é preciso ter em consideração que as sondagens relativas à eleição geral têm pouca importância nesta fase e que, mais do que as sondagens nacionais, importa perceber a posição de cada candidato nos battleground states. Basta recordar que, há quatro anos, Hillary Clinton teve mais três milhões de votos do que Donald Trump, mas saiu derrotada devido a alguns milhares de votos nos estados decisivos, em particular no Midwest. 
Assim sendo, parece-me muito cedo para tecer considerações definitivas e absolutas relativamente às hipóteses de qualquer um dos candidatos no resultado final do Colégio Eleitoral. Podemos, contudo, perceber as nuances de cada candidatura e parece-me evidente que a nomeação de Bernie Sanders reduziria o tabuleiro de jogo para os democratas no que diz respeito aos estados em jogo. Em primeiro lugar, o resultado na Florida deixaria de ser um toss up e passaria a estar na coluna dos estados com favoritismo para os republicanos, já que o sunshine state é um dos estados mais envelhecidos do país e o grupo social dos idosos é um daqueles onde Sanders consegue piores resultados. Além disso, com o seu posicionamento ideológico bem mais à esquerda do eleitoral médio norte-americano, o senador pelo Vermont poderia ter piores resultados junto do eleitorado independente, pelo que estados com eleitorados moderados (a Virginia, por exemplo) ou onde os democratas têm conseguido, mais recentemente, aproximar-se dos republicanos, podem ficar numa posição menos favorável para o partido Democrata, casos da Georgia, do Arizona e da Carolina do Norte.
Por outro lado, a nomeação de Sanders poderia reforçar a posição democrata junto dos hispânicos, grupo em que Bernie tem conseguido bons resultados nas primárias. Mas o principal argumento a favor do Senador do Vermont seria a possibilidade de conseguir esvaziar algum do discurso de Trump que mais agradou ao operariado branco do Midwest e que foi o mais prejudicado pela globalização e pela crise económica e, assim, fazer regressar à coluna democrata os estados do Michigan, Pennsylvania e Wisconsin (e, quem sabe, o Iowa). Se o conseguir, ficará muito perto de ser o 46º presidente dos Estados Unidos. 
Em resumo, apesar de ser muito cedo para tecer grandes considerações sobre a corrida pela eleição geral de Novembro, parece-me que existe um caminho para a vitória de Sanders contra Trump. Será, porventura, uma via mais estreita do que aquelas com que contaram Barack Obama e Hillary Clinton, mas isso até poderá nem ser negativo, pois permite uma alocação de recursos mais eficaz, ainda que represente uma espécie de all in, sem direito a plano B.
De qualquer forma, este exercício é meramente teórico, em especial numa altura em que é até pouco provável que seja Bernie Sanders o nomeado presidencial do Partido Democrata - o 538 de Nate Silver atribui-lhe apenas 2% de chances de vitória. Mas o mesmo aconteceu já a Biden, e há muito pouco tempo, por isso o melhor é mesmo esperar para ver se Bernie can win.

quinta-feira, 5 de março de 2020

É oficial: Joe vs Bernie

Confirmou-se o cenário anunciado após os resultados da Super Tuesday: Michael Bloomberg e Elizabeth Warren desistiram e, agora, a corrida está entregue apenas a Joe Biden e Bernie Sanders - um deles será o nomeado democrata para a eleição presidencial de Novembro, ainda que Tusi Gabbard mantenha a sua (irrelevante) candidatura.
Bloomberg apostou todas as suas fichas na série de eleições primárias da passada Terça-feira, mas não colheu frutos dessa estratégia. Entrou tarde na corrida e utilizou uma táctica pouco ortodoxa de evitar os primeiros estados a irem a votos (até porque já não foi a tempo de se inscrever nessas eleições) e realizar uma verdadeira barragem de anúncios televisivos e investir num exército de staffers com que pretendia saturar os mercados dos estados da Super Tuesday com a sua mensagem: Trump só poderia ser derrotado por um moderado, experiente, mas, acima de tudo, por alguém que fez (muito) mais dinheiro no sector privado do que o actual presidente. Contudo, a pálida imagem que transmitiu no único debate televisivo em que participou minou a sua aura de combatividade e invencibilidade com que pretendia derrotar Trump. Depois, o triunfo esmagador de Biden na Carolina do Sul, reabilitou a figura do antigo Veep como um moderado com possibilidades de ser eleito e isso afastou muitos eleitores de Bloomberg. 
Sem surpresa, o multimilionário anunciou a suspensão da sua campanha e endereçou o seu apoio a Joe Biden. Este endorsement não traz qualquer surpresa, pois Bloomberg nunca escondeu que, além do objectivo prioritário de impedir um segundo mandato de Donald Trump, queria também evitar a nomeação de um representante da ala mais liberal do Partido Democrata. Em conjunto com o endorsement de Bloomberg, Biden poderá também contar com o seu apoio financeiro, que será importante para eliminar ou atenuar a vantagem monetária de Bernie Sanders. 
Um dia depois, hoje, foi a vez de Elizabeth Warren anunciar a sua desistência da corrida presidencial. A senadora pelo Massachusetts foi, desde a sua eleição para a câmara alta do Congresso norte-americano em 2012, umas das grandes figuras liberais dos Estados Unidos e era grande a expectativa em torno da sua candidatura. Durante o Outono de 2019, Warren alcançou mesmo o estatuto de frontrunner, surgindo recorrentemente no topo das sondagens, mas foi mais um exemplo de um candidato cujo pico de rendimento surgiu demasiado cedo, começando a perder fulgor pouco antes do caucus do Iowa, em detrimento de Sanders e de Pete Buttigieg. 
Ao comunicar a suspensão da sua campanha, Elizabeth Warren não declarou o apoio a qualquer dos candidatos restantes, mas é ainda possível que o faça, mais logo, quando realizar uma conferência de imprensa que já anunciou. Sanders será sempre o favorito a almejar o endorsement de Warren, mas não é certo que isso aconteça, já que a Senadora do Massachusetts, apesar de se encontrar no espectro mais liberal do Partido Democrata, tem bastantes mais ligações ao establishment democrata do que Sanders, um independente anti-sistema. É, por isso, possível que Warren opte por não apoiar nenhum dos candidatos, sendo menos crível que apoie oficialmente Biden.
A partir de agora, com o campo de candidatos "limpo", veremos verdadeiramente o que valem as candidaturas de Joe Biden e Bernie Sanders. Os resultados das próximas primárias, com destaque para as do Michigan, no dia 10, e da Florida, no dia 17, deverão ser verdadeiramente decisivas para o que resta da disputa pela nomeação. Com base nas últimas sondagens, Joe parece levar alguma vantagem, mas teremos de ver os efeitos das desistências dos últimos dias para termos uma melhor perspectiva sobre o estado da corrida, após assentar todo o pó deixado pela verdadeira tempestade de areia que representou a Super Tuesday.

quarta-feira, 4 de março de 2020

The comeback oldie

Em 1992, Bill Clinton, na altura com 45 anos, ficou conhecido como o "The Comeback Kid", após o seu surpreendente segundo lugar na primária do New Hampshire, quando a sua candidatura à Casa Branca parecia estar já condenada ao fracasso. Ontem, 28 anos depois, Joe Biden, com 78 anos, mostrou estar à altura do epíteto de "Comeback Oldie", ao amealhar uma série de vitórias na famosa e importante Super Tuesday.
Após as desastrosas prestações de Biden nos primeiros estados e a consequente fuga de contribuições financeiras, chegou mesmo a falar-se na sua possível desistência. Contudo, tudo mudou no passado Sábado, quando o ex-Vice-Presidente de Barack Obama triunfou na primária da Carolina do Sul por uma diferença (de 30 pontos percentuais) que nenhuma sondagem previu. Com essa vitória, Biden alcançou, por direito próprio, o estatuto de representante da ala moderada do Partido Democrata e, a partir daí, o establishment democrata começou a cerrar fileiras à sua volta. As desistências de Amy Klobuchar e Pete Buttigieg a seu favor foram os sinais mais visíveis da mudança no momentum da corrida, quando Bernie Sanders parecia bem lançado para a nomeação, após os bons resultados no Iowa, New Hampshire e no Nevada.
Na Super Tuesday deste ano, estavam em jogo 1617 delegados e, à hora a que escrevo estas linhas, falta apenas conhecer o vencedor no Maine (onde Biden leva uma minúscula vantagem), sabendo-se que Joe venceu os estados do Alabama, Arkansas, Massachussetts, Minnesota, Carolina do Norte, Oklahoma, Tennessee e o Texas, tendo, neste momento, cerca de 400 delegados na sua coluna. Por sua vez, Bernie Sanders foi o mais votado na Califórnia, no Colorado, no Utah e no seu home state Vermont, amealhando cerca de 320 delegados.
Michael Bloomberg e Elizabeth Warren tiveram uma noite para esquecer e é provável que desistam nos próximos dias (a campanha do antigo Mayor de Nova Iorque já anunciou estar a avaliar a situação) pois dificilmente terão relevância na disputa. Bloomberg, que sempre disse querer evitar a nomeação de Sanders, deverá anunciar o seu apoio a Biden, enquanto Warren, que pretendia manter-se na corrida até à convenção de Julho, poderá apresentar o seu endorsement ao senador independente pelo Vermont.
Agora, as primárias democratas são definitivamente uma corrida a dois entre Biden e Sanders. De um lado, o establishment democrata, que saiu em força, nos últimos dias, em auxílio de Joe Biden. No seu lado da barricada, o antigo VP conta com os eleitores mais moderados, mais velhos e com os afro-americanos. Do outro lado, com Bernie, vemos os eleitores mais liberais, os mais jovens e os hispânicos. Sem o peso do partido por detrás, mas com uma grande pujança financeira, a campanha de Sanders ainda está na luta. Contudo, depois da noite de ontem, parece claro que Biden é o frontrunner. Além de contar com o momentum  da corrida, as próximas primárias parecem favorecer o antigo senador do Delaware, com destaque para a contenda no grande e importante estado da Florida, com um perfil de eleitorado muito averso a Sanders.
No próximo dia 10, será possível tomar novamente o pulso ao eleitorado democrata, quando decorrer uma espécie de mini Super Tuesday. Será importante seguir as sondagens que forem publicadas e os endorsements que deverão começar a "sair" com mais regularidade. Todavia, o apoio mais esperado, o de Obama, tão cedo não será conhecido e pode mesmo não acontecer até haver um nomeado, sendo certo que, entre o seu Veep e Sanders, o 44º Presidente preferirá sempre o seu antigo braço direito.
Entretanto, na Casa Branca, Donald Trump, entre ataques no Twitter e declarações sobre o corona vírus, vai esperando para ver quem será o seu adversário em Novembro.