Mas, além de Biden não ser um candidato tão fraco como alguns possam pensar, é ainda, porventura, o candidato ideal para derrotar Donald Trump. Bem sei que esta não é uma opinião muito consensual, em especial junto daqueles que gostariam de ver alguém mais jovem ou diferente do tradicional candidato presidencial norte-americano - homem, branco, político de carreira. Ainda assim, a meu ver, Joe é um concorrente muito forte para esta eleição presidencial, precisamente por isso mesmo: por ter essas características, é o oposto de Trump, mas, ao mesmo tempo, não tem os anti-corpos que tinha, por exemplo, Hillary Clinton.
Os quatro anos de Donald Trump na Casa Branca romperam com todas as convenções que norteavam o comportamento de um presidente dos Estados Unidos. Trump insulta adversários, rasga acordos, comunica através de irritados tweets, ignora os conselhos dos especialistas e prefere seguir o seu instinto, resiste a condenar organizações de supremacia branca e a dizer que cederá pacificamente o poder. Por tudo isto e muito mais, não admira que o Germano Almeida, especialista português sobre política norte-americana, diga que "isto não é bem um presidente dos Estados Unidos".
Assim sendo, é inevitável que muitos americanos desejem agora um regresso à normalidade. Com Joe Biden, que conhecem há largos anos, essa normalidade é garantida, ainda que Trump teime em dizer que o ex-vice de Barack Obama está refém da ala mais liberal do Partido Democrata. Além disso, a sua personalidade é o perfeito oposto de Trump. Mesmo os seus antigos colegas senadores republicanos não escondem que Joe é uma excelente pessoa, com valores morais e familiares que são sempre muito valorizados por uma grande parte do eleitorado norte-americano. Depois de Donald Trump, ter um presidente que é um nice guy pode ser uma mudança vista com bons olhos por muitos eleitores.
Apesar de estar há muitos anos no centro do panorama político norte-americano, Joe Biden nunca se viu envolvido em escândalos de maior. Apesar das suas conhecidas gaffes e da polémica relacionada com plágios em discursos que acabaram com a sua candidatura presidencial (1988), Biden passou sempre uma imagem de honestidade e de preocupação com a causa pública. As suas políticas moderadas não provocam grandes aflições aos mais conservadores e sempre fez questão de se mostrar como um homem do povo (ia trabalhar de transportes públicos). Por isso, os seus índices de favorabilidade andam no terreno positivo, ao contrário dos de Trump (e dos de Clinton, há quatro anos) e consegue muito melhores resultados junto do eleitorado branco com menor escolaridade e mais velho, o que pode ser determinante para evitar a repetição do desfecho da eleição de 2016.
As características pessoais e políticas de Biden retiram muita capacidade de contra-ataque a Donald Trump. Depois de vencer uma Hillary Clinton rodeada de polémicas - os emails, as milionárias conferências no sector privado, os deplorables, Benghazi, etc. - o actual presidente não tem, desta vez, muitas armas para utilizar contra o seu adversário. Como apontou, e bem, Ricardo Costa, no Expresso da semana passada, o facto de Trump não ter um adjectivo mais negativo do que sleepy para associar a Joe Biden, diz muito da falta de argumentação negativa que possa ser usada para atacar o democrata.
Por tudo isto, não acho surpreendente que, depois de Obama e de Trump, que basearam as suas candidaturas na ideia de mudança, Biden surja agora com um tema de campanha que pode ser visto como o regresso à normalidade após os loucos anos do trumpismo. Ou seja, depois da tempestade Trump, Joe Biden pode representar a bonança. E talvez seja mesmo disso que os Estados Unidos estão a precisar.
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